Com frases confusas e bom humor, técnicos transformam entrevistas numa atração à parte
As coletivas dos “professores” reúnem desde declarações enigmáticas até um inusitado protesto contra programas de milhagem das companhias aéreas
Marcelo Laguna, iG São Paulo
Oswaldo de Oliveira: "futebol é contest"/Crédito: site oficial do Kashima Antlers |
Entre os técnicos mais badalados do futebol brasileiro, Emerson Leão já ficou famoso por suas entrevistas. Ex-treinador do rebaixado Goiás, Leão adora colocar adjetivos e pronomes onde normalmente eles são dispensáveis, tornando as frases confusas. Já quem gosta de dar entrevistas "diferentes" é Oswaldo de Oliveira, há anos trabalhando com sucesso no futebol japonês.
Quando era comandante do São Paulo, entre 2002 e 2003, surpreendeu os repórteres que estavam no CT da Barra Funda, ao disparar numa coletiva que “futebol é contest”, em uma tentativa pouco comum para definir que está na competição, na disputa, a essência do futebol.
Hoje em dia, o maior representante das entrevistas despojadas do “estilo boleiro” é Tite, treinador do Corinthians. Professor de educação física, inteligente e com um vocabulário muito rico, Tite acaba deixando seu lado prolixo prevalecer, tornando as entrevistas um verdadeiro labirinto de ideias.
Não foi à toa que na internet já surgiu uma brincadeira com o estilo das entrevistas do técnico gaúcho: “O Fabuloso Gerador de Entrevistas Coletivas do técnico Tite”, citado em um post do Blog da Redação do iG, ironiza o que já se tornou conhecido entre os jornalistas como “titês.
Em uma de suas recentes coletivas, Tite disparou esta tese: "Não acredito que só a defesa que defende. Entendo que uma equipe se defende. Eu tenho ‘N’ exemplos. O Zico participava muito do jogo sem bola. O Maradona, no livro dele, diz que ele e o Valdano dificultavam a saída de bola dos adversários da Argentina, na Copa de 86. Em 2002, vocês se lembram? A jogada que deu origem ao primeiro gol da final nasceu de uma roubada de bola do Ronaldo, que tocou para o Rivaldo chutar, o Kahn dar o rebote, e o Ronaldo marcar. Eu acredito que é a equipe que se defende e é a equipe que ataca", disse o treinador, divagando um pouco, quando perguntado sobre a importância da defesa corintiana.
Logo em sua chegada ao Corinthians, antes do clássico contra o Palmeiras, Tite se enrolou para falar de seu papel no dérbi. “A minha contribuição para a equipe é de dar esta harmonia, neste curto espaço de tempo, nestes oito jogos decisivos. Neste primeiro jogo contra o Palmeiras, eu sei da grandeza do clássico, de retomar, de dar mais um passo na retomada daquele mesmo padrão que o Corinthians tinha tempos atrás.”
Resposta padrão
O antecessor de Tite, Adilson Batista, já tinha na ponta da língua uma resposta sempre que os jornalistas pensavam em questioná-lo sobre a dificuldade de alguma partida. “Não existe jogo fácil. Na verdade, a única partida fácil vai ser contra vocês (jornalistas) no final do ano. Nesse eu sei que a gente ganha fácil. Tem uns são-paulinos pra chegar junto. Esse jogo vai ser fácil. Esse eu garanto.”, disse Adilson quando ainda era técnico do Corinthians em pelo menos três entrevistas coletivas pré-jogo. Era com essa resposta que ele lidava com perguntas sobre a possível facilidade que o clube enfrentaria contra adversários como Grêmio Prudente, Ceará e Atlético-GO, todos adversários que enfrentou no Pacaembu.
Como é tradição nos grandes clubes, sempre ao fim das temporadas, há uma “pelada” entre membros da comissão técnica e os jornalistas que cobrem o dia a dia do clube. Adilson só não resistiu no cargo para colocar sua teoria em campo.
Outro que às vezes se perde na tentativa de explicar demais seu raciocínio é Paulo César Carpegiani, treinador do São Paulo. Ao comentar o motivo de ter trocado Casemiro por Marlos, na vitória de 2 a 1 sobre o Atlético-PR, no returno, Carpegiani saiu-se desta maneira: "Não sei se vocês estão pegando. Na minha cabeça é um tabuleiro e fica fácil de explicar para vocês. O Casemiro saiu porque existia a necessidade de eu colocar um atacante. O Marlos confundiu a marcação, havia a necessidade de trazer mais o Jean para o meio, trazendo o Carlinhos e o Fernandão”, explicou o treinador. “Gostei porque tivemos bastante posse, dominamos o adversário. Sempre foi um jogo perigoso, o Atlético-PR vendeu caro a derrota, mas nós impusemos o ritmo, era para ser mais dilatado o escore. O 2 a 1 podia redundar no escore, causar algum transtorno. Casemiro não saiu porque errou a bola, não faço esse castigo". Será que alguém está perguntando onde esta a tecla SAP para entender Carpegiani?
Bom humor
Mas o campeão das entrevistas divertidas deste Campeonato Brasileiro é o treinador do Botafogo, Joel Santana. Em parte por causa da boa campanha da equipe carioca na competição, Joel é dono de um humor contagiante. E faz questão de mostrar isso nas entrevistas. "Quando você vai numa festa de criança, você prefere pastel ou empadinha? Eu prefiro os dois, rapaz, é difícil demais escolher. Eu gosto dos dois", comentou Joel Santana, sobre jogar com bola aérea ou bola rasteira.
Antes do duelo contra o Palmeiras, no dia 10 de outubro, pelo returno do Brasileirão, Joel resolveu brincar com Luiz Felipe Scolari. "Nenhum dos dois jogou nada. Fomos muito ruins, demais. Deve ser por isso que somos bons técnicos hoje. E eu convivo com muitos profissionais que vivem falando que jogaram muito bem. Jogaram nada, gente, é tudo balela. Por isso é bacana, o Felipão também admite que foi grosso de doer", afirmou Joel, sobre a carreira dele e de Felipão como jogadores.
A mais estranha entrevista do treinador botafoguense, contudo, foi quando ele resolveu protestar contra as companhias aéreas que não liberava as milhas de suas viagens. "Passei o dia irritado desde ontem. Tenho muitas milhas para trocar e vou perdê-las. Quero trocar, mas não consigo falar com a companhia aérea de jeito nenhum. Vocês têm que colocar ai no jornal, isso é sério. Eles fazem a gente de gato e sapato”, reclamou.
Até entre os treinadores mais consagrados as entrevistas são inusitadas. Ninguém superou em 2010, neste quesito, Luiz Felipe Scolari, que muitas vezes confundiu sarcasmo e ironia com falta de educação em suas respostas. “Que saco vocês, hein tchê? E daí? Jogou bem. Dezoito minutos para mim está ótimo. Se amanhã jogar dez, está melhor ainda. Vocês estão de palhaçada. Entrevistem o médico. P..., todos vocês estão de palhaçada. E tu é um dos mais palhaços”, atacando os repórteres que insistiam em saber o motivo do meia Valdivia ter jogado apenas 18 minutos contra o Atlético-MG, pela Copa Sul-Americana.
Já Vanderlei Luxemburgo, técnico do Flamengo, apelou para uma metáfora meio sem graça quando ainda dirigia o Atlético-MG e foi tentar justificar a derrota para o Cruzeiro. “A manteiga está caindo do lado contrário, está caindo virada de cabeça para baixo, daqui a pouco vai virar para a gente não perder a manteiga. Isso é futebol”, disse Luxemburgo, após derrota por 1 a 0 para o Cruzeiro em 1º de agosto.
*Colaboraram Bruno Winckler, Levi Guimarães, Danilo Lavieri, Renan Rodrigues e Vicente Seda
Um comentário:
Esses técnicos prestam um bem inestimável ao Brasil ao enriquecer o nosso rico e folclórico Febeapa - festival de besteiras que assola o país. Boa, Laguna! Abraços.
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